Souvenir #14 – A vida virando uma colcha de retalhos alheios
E a minha relação com a pipoca doce
Tempo de leitura: 5 minutos.
Esse texto é um desabafo. A maior parte dele foi escrita na tranquilidade da Vila Bom Jardim em Nobres, no Mato Grosso.
Nesses últimos anos em que passei a compartilhar mais a minha vida e as minhas escolhas, percebi ainda mais que as pessoas gostam muito de opinar sobre o que deveria ser importante para o outro.
Perdi as contas de quantas sugestões, comentários, dicas, orientações, conselhos ouvi em todo esse percurso. E eu ouço de coração, disposta a extrair algo dali (ou não). Só que tanta opinião pode gerar uma baita pressão.
Eu sei, eu sei — muitas vezes não é por mal. Mas, nem por isso deixa de fazer mal.
Já reparou a quantidade de posts de instagram começam com “VOCÊ TEM QUE” isso ou aquilo? Você tem que conhecer tal lugar! Você tem que experimentar tal comida! Você tem que ver tal série! Não sei você, mas me bate uma ansiedade.
Você tem que nada.
Fear Of Missing Out, FOMO, já ouviu falar? É tanta gente fazendo tanta coisa o tempo todo que sentimos que estamos perdendo algo, deixando de viver uma coisa incrível que o fulaninho do instagram está postando. Gente, isso é cansativo.
Não sou contra as redes sociais, nem contra compartilhar experiências e afins. Tenho até suspeitas que já posso ter me comportado com a pessoa que diz o “tem que” em algum momento. (desculpa aí)
Só que eu percebo que, de certa forma, esse jeito de funcionar está deixando as pessoas ainda mais preguiçosas. Não puxam mais conversa com o garçom do barzinho para saber qual a boa do dia porque já chegam lá com todas as dicas do que comer e beber. Quando viajam, nada de conversar com os locais, entender como funciona o lugar, as pessoas e a cultura. O foco é dar o check nos pontos mais instagramáveis, fazendo a pose da blogueira, claro.
A vida vira uma colcha de retalhos alheios, cada pedacinho é uma reprodução do que alguém disse ou fez. A cada dia, exercitamos menos os nossos sentidos. Vemos pelos olhos do outro, ouvimos a música que está na trend, usamos a roupa da moda, comemos no restaurante hypado. Um amontoado de gente diferente-igual.
Com a internet tornando o mundo cada vez mais acessível, faz sentido vermos tanto do mesmo nas redes. Faz sentido a sensação de que estamos sendo levados para um mesmo lugar.
Padronização do consumo, padronização dos nossos modos de ser e agir com base em uma referência dominante. Essas são algumas das consequências da globalização, que como tudo na vida, tem um lado não tão bom. Até a beleza, hoje, é padronizada.
Dentro desse mundinho digital que nos abriga, vemos (às vezes, pelo lado de dentro) o famoso movimento de manada. Da forma como a sociedade existe hoje, pensar diferente requer esforço, ter acesso ao diferente requer esforço, seja financeiro ou, no mínimo, mental.
Numa sociedade tão cansada, até que ponto queremos ter esse esforço?
Existem tantas questões no meio disso tudo.
Hoje, tenho ainda mais certeza de que o importante não é ser do contra e simplesmente rejeitar os padrões. O importante é se questionar. Uma mente alheia aos próprios anseios acaba reproduzindo o que vê, sem deixar espaço para o que desconhece, para o que dá medo e curiosidade ao mesmo tempo.
Questionar-se. Escolher uma roupa porque você gosta, e não apenas porque está na moda. Conhecer um lugar porque você quer, e não porque você “tem que”. Ouvir uma música porque ela te faz sorrir e não porque todo mundo sabe cantar.
Claro que algumas coisas são tão comentadas que a gente fica curioso (eu sou dessas, inclusive). Mas, é bom diferenciar. Às vezes, é só curiosidade mesmo – como quando eu coloquei para tocar uma música do Léo Santana (vem deslizando, vem). Me diverti um pouco e matei minha curiosidade. Até salvei no Spotify pra rir de vez em quando, mas sei que está longe de ser o que eu realmente gosto.
Outras vezes, só queremos seguir o caminho do que é facilmente aceito socialmente, mesmo contra o que somos. Já fui/às vezes sou dessas também. Desde criança, tentando não ser julgada, coitada. Eu odeio aquela pipoca doce do pacotinho rosa. Odeio - palavra forte, eu sei, mas é a pura verdade. E ela vinha em TODAS as lembrancinhas de aniversário quando eu era criança. Deixava o pacote rechonchudo, e eu pensando que estava cheio de pirulito ou chocolate. Iludida, só para me fazer odiar mais ainda a bendita. Perdi as contas de quantas vezes tentei comer aqueles pedacitos de isopor só porque eu via meus amiguinhos fascinados com aquelas bolotas de textura estranha e sabor questionável. Até depois de velha — digo, adulta, eu tentei gostar. Mas, realmente não rolou e eu cansei. Não gosto da pipoca e parei de tentar gostar só porque “todo mundo gosta”. Se fizesse bem pra saúde pelo menos, mas nem isso. Aí, não dá, né?
O mais contraditório é que ao reproduzir parte do que vemos, ouvimos e lemos, estamos todos tentando ser, pasmem, diferentes. Porque ser diferente é mais legal, claro. Essa é uma situação que parece a do cachorro correndo atrás do rabo — não faz sentido.
Às vezes, eu caio nessa. Mas, no geral, eu parei de tentar. Não quero saber, ser ou ter o que está “na moda” só porque é o hype do momento. Também não quero ter que me esforçar para ser “diferente”. Toda essa paranóia cansa.
O meio termo desses dois mundos é o meu. E é aí que eu sigo feliz :)
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“Uma mente alheia aos próprios anseios acaba reproduzindo o que vê, sem deixar espaço para o que desconhece”
Demais! Amei o texto todinhooo
Acho que uma parte importante é entender que mesmo que algo faça muito sentido para você, as pessoas são diversas e isso definitivamente não vai fazer sentido pra todo mundo. E que difícil isso de colocar o limite nas nossas relações e interações para evitar tanto pitaco, né? Sei que não é por mal que as pessoas ficam nesse tanto de pitaco na vida alheia, mas confesso que eu seguro minhas respostas que estão sempre na ponta da língua kkkkk
Saudadeee!!!
Estou indo para Buenos Aires em setembro passar 35 dias e o que mais tem acontecido:
- você tem que ir para tal lugar que eu fui na minha última vez
Eu só quero ir para a minha Buenos Aires, que é a que eu vou descobrindo ao acaso.